As maiores estrelas do futebol costumavam ter lugares para encerrar suas carreiras com dignidade. A economia do esporte agora exige que suas humilhações sejam públicas.
Cristiano Ronaldo, um dos maiores que o futebol já viu, vem passando por um momento triste em Manchester. Triste é mesmo a palavra, pois ver um jogador como ele, com todo o tamanho que tem, passar por isso na carreira é algo que o futebol ainda não viu. Se viu, não foi com alguém como Ronaldo
Sufocante Old Trafford
O time titular do Manchester United apareceu primeiro, saindo em Old Trafford junto com seu adversário da noite, o Tottenham Hotspur. Depois vinham os reservas, com coletes de treino acompanhados pelos membros da comissão técnica.
Só então, quando os jogadores se alinharam, os substitutos tomaram seus lugares e as respectivas equipes técnicas foram para o banco, Cristiano Ronaldo surgiu, caminhando alguns metros atrás do meio-campista Scott McTominay.
Pode ter sido por instinto ou pode ter sido por design, mas naquele momento, a câmera foi atraída para ele, CR7 era o destaque.
Não, é claro, que precise de muita desculpa. Quatro minutos depois, com o jogo ganhando seu ritmo, Ronaldo voltou a aparecer no banco de reservas, no centro da tela. Isso se tornou um papel familiar para ele durante grande parte desta temporada. Um dos melhores jogadores da história do futebol reduzido ao espectador mais importante do estádio.
O retorno
Durante grande parte da temporada passada, a primeira de sua segunda passagem por Old Trafford, Ronaldo foi a inspiração e o tema do que foi, inicialmente, um debate convincente sobre o equilíbrio entre conquistas individuais e sucesso coletivo.
Ele marcou gols, foram 18 em 30 jogos apenas na Premier League, o mais produtivo do clube de longe. Tem ficado bem claro há meses onde Erik Ten Hag, atual técnico do United, se posiciona diante de tudo. Ele não tem poupado elogios a Ronaldo em público, tanto em termos de seu legado duradouro para o esporte quanto em sua utilidade contínua para o time, mas suas palavras foram abafadas por suas ações.
Ronaldo foi titular em apenas dois jogos da Premier League nesta temporada. O primeiro envolveu a derrota por 4 a 0 no intervalo contra o Brentford. O segundo terminou em um empate contra o Newcastle. O jogador passou a maior parte do tempo enfrentando times como Omonia Nicosia, Sheriff Tiraspol e Real Sociedad na Liga Europa.
Entrando nos eixos
A vitória do United contra os Spurs foi provavelmente o melhor desempenho do reinado de Ten Hag, foi uma ilustração convincente do motivo pelo qual Ronaldo está fora. O time está funcionando, mesmo diante de todas a dificuldades apresentadas na temporada até aqui.
A exclusão de Ronaldo no time é um ponto de discussão. Os torcedores, conscientes do que ele era ainda cantam seu nome sabendo o que o jogador significa para o futebol e também para o clube, por mais que esteja demonstrando sinais de cansaço e clara insatisfação.
A verdade por trás dos olofotes
A verdade é que Ronaldo está preso a uma função da economia do futebol moderno. Poucos jogadores, se é que algum, fizeram tanto quanto Ronaldo para transformar o futebol no monstro financeiro que se tornou.
Agora, porém, o português sofre com isso. Todos os jogadores, mesmo os melhores, chegam ao fim. Com as pernas cansadas ou o corpo doendo, eles procuram um lugar um pouco mais confortável para passar seus últimos anos, em algum lugar onde a cobrança seja menos gritante ou as demandas não tão exigentes ou a tarefa um pouco menos difícil do que nos maiores cenários do futebol.
Os torcedores europeus tendem a zombar quando os jogadores optam por se mudar para a Turquia, MLS ou até mesmo para a China, mas vale a pena considerar que não faz muito tempo que o grande lar de idosos do futebol foi a Premier League dos anos 1990.
O caminho para o fim
Havia todo um grupo de clubes que estavam dispostos a desempenhar esse papel de casa para os que precisavam no fim da carreira. Para Ronaldo e Ronaldinho, por exemplo, foi Milan em declínio. Para Rivaldo foi o Olympiacos. Mesmo Diego Maradona depois de dois escândalos de drogas, conseguiu encontrar um ponto de conforto por um tempo no Sevilla.
Para alguns, essas rotas ainda existem. A sedução do projeto da MLS levou Gonzalo Higuaín, por exemplo, ao Inter de Miami e Giorgio Chiellini e Gareth Bale ao Los Angeles FC. Grandes jogadores do cenário europeu em declínio que encontraram uma nova casa numa liga em ascensão.
É fácil acusar Cristiano Ronaldo não apenas de ganância, mas também de arrogância, apontar que ele encontraria inúmeros pretendentes dispostos se aceitasse um corte salarial e um rebaixamento de status.
O problema é que ele não precisa fazer isso. Ele estava lentamente exibindo sinais de que estava diminuindo seu desempenho, isso ficou claro quando deixou a Juventus há pouco mais de um ano e ainda assim o Manchester United ainda estava disposto a contratá-lo, não apenas pela história do jogador com o clube, mas pelo impacto da marca, pela exposição, pelos seguidores do Instagram. Não há razão para acreditar, quando ele deixar o United, que será diferente para seu próximo clube.
Valor de Cristiano Ronaldo
Ronaldo é simplesmente muito valioso, muito famoso, esportivamente atraente demais para ficar fora dos holofotes do futebol. Alguém, em algum lugar, oferecerá a ele uma quantia enorme de dinheiro para jogar.
E então este é o seu destino, já que uma das carreiras mais gloriosas de todos os tempos não chega ao fim de forma digna, cada última gota de energia, parece ser sugada, a cada jogo que passa o seu futebol parece perder o encanto e a força que teve durante anos de domínio.
O último ato
Pouco antes do apito final na noite de quarta-feira, com a vitória do United garantida, Ronaldo se levantou da cadeira, caminhou pela lateral do campo e desapareceu no túnel de Old Trafford. Ainda faltavam quatro minutos para o jogo.
Quando terminaram, ele havia deixado o estádio e desaparecido na noite, deixando uma sensação de rancor e ressentimento. No dia seguinte, Ten Hag decretou que Ronaldo seria proibido de treinar com seus companheiros pelo resto da semana como punição. Após o episódio ocorrido ele pode ter jogado seu último jogo pelo Manchester United.